Qual foi, Cervantes?
Se você é fã de Senhor dos Anéis, muito provavelmente já viajou em algum mapa da Terra Média. Mas você já viajou pensando nas relações entre cartografia e ficção?
Quem já fez essa viagem foi o historiador francês Roger Chartier. Em seu novo livro “Mapas e Ficções”, ele mergulhou nos séculos XVI e XVIII para destacar de quais maneiras a geografia aparece cartografada nas páginas de obras ficcionais.
A primeira delas é Dom Quixote de Miguel de Cervantes. Só tem um problema: no livro, não há sequer uma representação cartográfica. Uai, gente, mas como assim?
Bem, na versão original, não há mesmo nenhum mapa, mas na edição do século XVIII o livro recebeu a inclusão de mapas que destacam as andanças do cavaleiro errante; o que foi suficiente para Juan Antonio Pellicer, historiador oitocentista, tacar hate apontar o dedo:
"aqui cometeu Cervantes um notável erro de geografia (...) não é possível que Rocinante e o asno percorressem uma distância tão grande em tão pouco tempo".
Chartier justifica a incoerência ao dizer que não há, em Dom Quixote, correspondência entre a geografia e cartografia. Na verdade, os caminhos apresentados no livro estariam relacionados, sobretudo, às andanças do próprio Cervantes, numa espécie de geografia pessoal1.
Para entender essas e outras questões, além da leitura do livro em questão, recomendamos este aperitivo.
Mas, diz aí, você já gritou “MENTIRA!”, por considerar que a história apresentada no seu livro predileto não fazia sentido algum diante do mapa disponível? Ou, ao contrário: já houve alguma representação cartográfica que lhe ajudou a imergir muito mais na história?
Mais que mapas bonitinhos
Continuamos falando de mapas, mais especificamente dos medievais, pois queremos abordar a pesquisa da geógrafa Deyse Fabrício, vencedora do Prêmio Tese Destaque Unicamp 2023-2024 na categoria Ciências Humanas e Artes. Entre outros aspectos, a autora afirma que, ao se resumir um mapa medieval ‘como algo bonitinho’, deixamos escapar histórias e conhecimentos escondidos, como se fossem verdadeiros tesouros que habitam essas representações cartográficas.
O trabalho é muuuuuito interessante. Para ler um pouco mais, bora de clique aqui.
Mapa-mundo de Ebstorf (1240)
Outras edições dedicadas à cartografia:
Todo mapa tem um discurso
Por falar nas edições anteriores em que a cartografia esteve no centro do debate, como complemento às discussões citamos o documentário “Todo mapa tem um discurso” que trata sobre regiões marginalizadas que não pertencem ao mapa oficial da cidade:
Caso queira, veja também:
Plataforma de mapeamento interativo permite que agora usuários produzam seus mapas
Suíça e Itália redesenham fronteiras após derretimento de geleiras
Anteriormente em Notícias do Espaço:
Muito obrigado por acompanhar o Notícias do Espaço. Até a próxima!
Créditos:
Pesquisa e desenvolvimento: Higor Mozart e Gabriel Arquette | Financiamento: Programa Institucional de Apoio à Extensão (PIAEX) do Instituto Federal do Sudeste de Minas Gerais (Edital 02/2024) | Coordenação: Higor Mozart
Textos consultados: Roger Chartier mergulha no universo dos mapas ficcionais (Editora Unesp) e Pesquisador investiga encontro entre território mental, geografia pessoal, cartografia e literatura (Estadão).